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Em meados do século XIX o mundo vivia o que foi definido como uma realidade repleta de desigualdades sociais, sendo que a busca em se encontrar o equilíbrio entre os extremos (desiguais) configurou o conceito “justiça social”, que significou a criação de mecanismos de proteção a favor dos mais fracos.

Esse conceito teve nesse momento um conteúdo baseado em princípios político e moral que fundamentam a igualdade de direitos, mas tendo como referência a distribuição da riqueza produzida no mundo. Poderia se dizer que o conceito justiça social nesse sentido esteve mais sustentado por dois pilares: econômico (necessidades materiais) e político (direitos de cidadania).

 

Olhando para a realidade atual do Brasil eu diria que outro pilar precisa ser posto, formando assim um tripé: o pilar sociocultural, que contemple dimensões objetivas e subjetivas dos sujeitos. Isso nos leva a entender o que diz Rawls, quando aponta que uma sociedade é justa ao respeitar como princípios: garantia das liberdades fundamentais para todos; igualdade equitativa de oportunidades; manutenção de desigualdades no foco apenas para favorecer os mais desfavorecidos (A Theory of Justice, 1971) e não como forma de se ampliar essas desigualdades no mundo.

A ênfase dada também nos aspectos socioculturais tem sido o mote de muitas lutas que têm acontecido mais fortemente da segunda metade do século passado até os dias atuais. Os movimentos no Brasil que defendem bandeiras étnico-raciais e de gênero lutam para que suas diferenças não os transformem ou os mantenham como desiguais, mas que conquistem direitos iguais, no contexto de uma sociedade que tenha como princípio ordenador de suas políticas estruturantes e conjunturais a justiça social nessa ótica tridimensional, isto é, com igualdade de direitos aos bens materiais, participação política, respeito às diversidades culturais e dos sujeitos. Nesse sentido, igualdade de direitos do diverso não pode ser confundido com igualdade apenas do que é comum, entre os pares.

Como combater as injustiças sociais e garantir direitos iguais? Muito sinteticamente aponto dois exemplos para essa questão:

  1. Superar a injustiça econômica passa por mudanças estruturais. No Brasil, de 2003 até o momento (Janeiro / 2015) têm sido propostas e implementadas políticas compensatórias para diminuir o fosso existente entre aqueles que têm muito e aqueles que nada têm. De alguma forma essa política tem recebido críticas, ou pelo desconhecimento de sua importância em qualquer país ou pela mera oposição político-partidária e não pela sua real necessidade no combate às injustiças econômicas. Ninguém questiona, por exemplo, os países europeus (Estado do Bem Estar Social) que há anos garantem uma renda mínima para todos os seus cidadãos desempregados.
  2. Para avançar no combate às injustiças socioculturais há a necessidade de mudanças culturais e simbólicas, como por exemplo, políticas voltadas para a melhoria de identidades historicamente desprezadas, valorização de conteúdos tradicionais e culturais de diferentes segmentos, o que não acontecerá se não houver o reconhecimento e o respeito dessas diversidades existentes. Nesse sentido, também políticas compensatórias brasileiras que garantiram vagas em universidades, e trabalhos melhor remunerados para pessoas negras, índios, pobres, etc. têm sido de grande importância.

Por fim, apenas uma ênfase no fato de que esse entendimento nos leva a incluir nas batalhas coletivas bandeiras de combate não apenas das injustiças econômicas, como também das injustiças culturais, muitas vezes mascaradas no nosso cotidiano.

De fato, há uma intersecção entre as duas formas e esse é o desafio, que contudo já conta com muitas experiências em todo o mundo. Quando essas experiências não são implementadas poder-se-ia dizer que isso ocorre ou por negligencia, ou por maldade, ou por opção ideológica.

Image: jor.br